Amor e Psicopatologia
- Cristiano F.

- 9 de out. de 2019
- 3 min de leitura
Atualizado: 20 de out.

Amar é parte da nossa condição humana. Amamos a vida, os outros e também a nós mesmos. Como lembra a psicanalista Maria Rita Kehl (2009), estamos “condenados a amar”: são esses laços de afeto que dão sentido às nossas existências e sustentam a forma como enfrentamos o mundo.
Mas, assim como o universo nasceu do caos do Big Bang, nós também somos constituídos por um “caos interior”, feito de desejos, fantasias e idealizações. O amor surge desse emaranhado, funcionando como energia que movimenta a mente e organiza a forma como enxergamos a realidade. Ele nos ajuda a enfrentar a angústia, o vazio e a estranheza que a vida muitas vezes apresenta.
O amor como cuidado
Uma das maneiras mais visíveis de amar está no cuidado que dedicamos a nós mesmos e aos outros. Essa herança é antiga: desde os primórdios da humanidade, a sobrevivência só foi possível porque o homem aprendeu a se proteger em grupo, a criar laços de afeto e confiança.
Sem amor, a vida corre riscos. Não à toa, Freud dizia:
“Em última análise, precisamos amar para não adoecer.” (1914)

O amor e o sofrimento psíquico
Na clínica psicológica, quase toda queixa traz consigo uma questão relacionada ao amor — seja na sua falta, no excesso ou na dificuldade de vivê-lo.
Um exemplo muito presente é a depressão. Andrew Solomon (2001) chega a afirmar que “a depressão é uma imperfeição do amor”. Quem sofre dessa doença costuma relatar perda de interesse pela vida, vazio, confusão mental e falta de energia para investir em si mesmo e nos outros.
Maria Rita Kehl (2003) descreve a depressão como um rompimento da rede de sentido que nos sustenta: quando o amor falha, o vazio aparece de forma insuportável.
Outro exemplo é a anorexia, transtorno em que a alimentação deixa de ser apenas questão de nutrição e passa a simbolizar amor e afeto. Para o anoréxico, comer ou não comer pode ser uma forma de pedir cuidado ou de expressar carência. Nesse sentido, o alimento é visto como signo de amor.
Lacan (1958) já havia apontado que a recusa em se alimentar pode se transformar em um desejo — não de comida, mas de afeto. Assim, mais do que fome de alimento, a anorexia revela uma fome de amor.
A clínica do amor
Seja na depressão, na anorexia ou em outras psicopatologias, o amor aparece como pano de fundo: sua presença, ausência ou distorção influencia diretamente o modo como sofremos e como buscamos ajuda.
Por isso, podemos dizer que a clínica psicanalítica é, acima de tudo, a clínica do amor. É no encontro terapêutico que muitas pessoas têm a chance de ressignificar seus modos de amar e, assim, encontrar novos sentidos para a vida.

Para refletir
Como o amor (ou a falta dele) influencia sua forma de viver?
Em que momentos você percebe que o cuidado consigo mesmo ou com os outros foi fundamental?
O que você entende como sendo uma “fome de amor”?
REFERENCIAL BIBLIOGRAFICO
Freud, Sigmund (1914). Introdução ao Narcisismo. Rio de Janeiro. Ed. Imago.
Freud, Sigmund (1930). Mal estar na civilização. Rio de Janeiro. Ed. Imago.
Kehl, Maria Rita. UMA EXISTÊNCIA SEM SUJEITO. 2003. http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2601200302.htm. acesso em: 2018.
Lacan, J. (1956-1957). O Seminário. Livro 4: A relação de objeto. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1995
Silva, A. N. (2005). Anorexia entre o desejo e o gozo. Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.



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